domingo, 26 de abril de 2009

Bunaken, o paraíso final

Do mar para a terra onde nos esperava um pequeno almoço “dos bons” (ai saudades de pão, iogurte e cereais), uma viagem em carrinha de caixa aberta com os locals até à vila mais próxima e dessa vila um bus até Manado.
Tínhamos 3 dias pela frente antes do vôo e nem penar passá-los no caos urbanístico de Manado. Foi chegar e apanhar logo um barco para o Parque Nacional de Bunaken, uma ilha off-shore Manado a apenas uma hora de barco. Este parque nacional é reconhecido a nível mundial pela qualidade do mergulho que oferece. E não enganou, foram 3 mergulhaços no azul ao longo de paredes verticais de coral sem fundo à vista ao sabor de uma leve corrente que faziam com que os mergulhos fossem feitos sem qualquer esforço e logo duravam 90 minutos (e sem fato...). Para além da elevada diversidade de coral e as constantes paredes densas de peixinhos de coral às cores num fundo azul, vimos passar tubarões de pontas brancas, tartarugas, barracudas, atuns, lírios, giant trevallis, napoleões e já no final do último mergulho passeava-se entre os corais a minha companhia da viagem a cobra marinha... Já só me faltava vê-la no seu habitat natural...

Queriam ver fotos disto tudo????? Também eu... Mas nesta altura já tinha chegado à conclusão que tirar fotos no azul com a minha máquina era uma perca de tempo e estava apenas a correr o risco de perder pormenores do mergulho. Por outro lado, nesta altura a máquina já ficava quase sempre esquecida, já que o meu dia-a-dia começava a ser repetitivo: selva, ilhas, mergulho, primatas, outra vez mergulho e depois selva, ahhh...


E com esta rotina chata chego ao fim deste loop na viagem da minha vida. Não me vou alargar em conclusões lamechas, até porque esta é apenas o final de uma etapa de uma viagem/aventura que se prevê mais longa. Quero apenas deixar aqui registado que hoje (numa das 16 passagens por aeroportos), ao passar o filme da viagem na minha cabeça, chego à conclusão que ela correu bastante melhor do que as expectativas que eu tinha criado inicialmente. E eu, quando anseio algo e fico a matutar nisso durante muito tempo, crio sempre expectativas demasiado altas quase sempre difíceis de satisfazer... Estou também orgulhoso pelo facto de ter começado e não ter desistido de escrever umas (por vezes muitas) linhas neste espaço para quem quisesse viajar comigo. Ainda que apenas uma só pessoa tenha acompanhado a viagem por inteiro, já valeu a pena. E as essa(s) pessoa(s) peço desculpas por introduzir a informação em blocos gigantes de mês a mês, mas isto de escrever, seleccionar e reduzir tamanhos de fotos dá uma trabalheira... Até jazz...

Tangkoko National Park, house of primates

Depois de um outro mergulho matinal em Lembeh, subimos até ao extremo norte da ilha para entrar na floresta do Tongkoko National Park e tentar avistar os black crested macaques no seu último reduto natural (sim, porque os que se podem encontrar no mercado de Tomohon não contam) e os Tarsius, o mais pequeno de todos os primatas. Este parque é também famoso por abrigar várias espécies de aves endémicas, um paraíso para birdwatchers. Para aumentar as probabilidades de ver toda esta bicharada, propusemos a um guia que nos levasse num treking na floresta durante dois dias. Resultou em cheio já que vimos quase todos os highlights. Ainda por cima o overnight foi feito numa bela praiinha de areia preta (já tinha dito que isto é vulcões por todo o lado?) com mar azulão (sim, a selva aqui entra quase pelo mar adentro). Só foi pena não termos visto os macacos virem até à praia para tomar banhos de mar como, segundo o guia, por vezes fazem.

Depois de montar as tendas ainda de dia, tempo para ir em busca dos Tarsius que saem ao lusco fusco em caça dos insectos, parecem Yodas saídos da guerra das estrelas. Chegada ao acampamento de noite, esperava-nos um banho nocturno no Pacífico a 30 ºC e uma sopa de noodles com arroz (nham, nham...). Já à volta da fogueira interrogávamos-nos acerca das centenas de luzes no mar. O guia dizia que algumas eram de barcos mas que a maioria eram de plataformas flutuantes usadas para pescar durante a noite, e que por acaso a sua família até inha uma dessas casas. Oh, conversa puxa conversa e quando demos por nós já tínhamos um plano para o após jungle: pernoitar e pescar na plataforma flutuante da sua família. Nesse mesmo instante ligou para alguém para confirmar e fomos brindados logo pela manhã com um peixinho acabado de apanhar na plataforma. Finalmente uma dose de proteína grelhada em brasas de fogueira para acompanhar os noodles com arroz ao pequeno almoço (mnham, mnham...).

A caminhada matinal tinha como objectivo ver tucanos mais de perto. É uma ave impressionante devido ao seu tamanhão, forma e cores que ostenta, mas difícil de conseguir uma foto já que anda sempre na canopy da floresta. Em vez de buscar uma foto da net fica aqui um desenho estilizado feito pelo Grande Sr. Desenhador de Cenas. Depois da caminhada, tempo apenas para um banho, alguma comida e lá estávamos nós a preparar o barco que nos levaria até a uma das floating houses numa praia de uma aldeia piscatória com porcos e galinhas a circular na areia e crianças a tomar banho de mar e sempre prontas para as fotografias.

A casa flutuante: uma simples estrutura de madeira tipo jangada feito com vários tipos de tábuas e troncos de pequenas árvores bem espaçadas entre si onde a única maneira de caminhar é em constante equilíbrio. Claro que para os locais com 1.5 m de altura e pés de orangotangos, era como caminhar em solid ground. Nós, tínhamos por vezes que usar as 4 patas para garantir que não caíamos dentro da rede que forra a plataforma por baixo, para onde o peixe é atraído por “super power lamps” e fica aprisionado. Lindo ou talvez não, foi que mal cai a noite, cai também uma chuvada que só parou já quase de manhã. Que belo sítio para estar à chuva... Os dois turistazinhos enfiaram-se logo no único abrigo da plataforma, uma pequena casa feita à medida deles ainda por cima com um buraco para poderem controlar o peixe na rede. Podem imaginar a bela noite que passamos ali a tentar dormir num chão de madeira com dimensões reduzidas. Já os locais estavam ali para pescar e passaram a noite toda à chuva mas em nenhum momento se puderam abrigar. Como compensação, no dia seguinte de manhã tivemos que mergulhar dentro da rede cheia de peixinhos (tipo anchovinhas) para retirar os que jaziam mortos e se acumulavam no fundo. Podem pensar “ah, mas isso até é nice”, eu também pensei isso até me aperceber que nós não éramos os únicos aliens dentro da rede das anchovas. Dei por mim a arrastar com o camaroeiro uma cobra marinha juntamente com o peixe morto... Começo a ter uma relação muito íntima com um animal que produz um veneno letal capaz de limpar o sebo a X humanos.

Happy Birthday to Gonças

Às 23:59 do dia 18 de Abril estávamos nós numa discoteca hard-core (que tirava todo o partido da tecnologia tuning dos mikrolets – alto bombanço!) da cidade portuária de Bitung. Connosco, um Irlandês com quem fizemos a viagem para Bitung, os seguranças que nos tentavam convencer dos encantos das suas “bailarinas” que povoavam até à linha do horizonte, aquele espaço comercial.

À meia noite, na varanda exterior, abrigados dos milhões de watts que bombavam lá dentro, comemoramos os meus 32 com “Bintangs” (a cerveja local) oferecidas pelos seguranças. Porém, a urgência de “desmoer” uma barriga de pedra, fruto da mistura do sumo de abacate do jantar com as Bintangs da discoteca, obrigou-nos a uma saída prematura de tão romântico espaço!


Durante este passeio nocturno deparamos-nos com alto bairro underground !!! Imaginem o antigo bairro de pescadores de Olhão, 3 ou 4 ruas de terra batida, barracas em platex com portas entreabertas a deixar passar a única luz que iluminava as ruas. Embora o ambiente cheirasse a facada, a esgoto(zinho) e as ratazanas descessem pelas paredes com extremo “há-vontade” perante humanos, o som altíssimo que saia pelas portas nada tinha a vêr com este ambiente pesado: Todas as casas eram de karaoke, todas passavam “Heavy Slow Rock” Indonésio a altos berros, com “beldades” locais agarradas ao micro a cantar cheias de feeling! Lindo!

Espreitamos para dentro de uma destas casas e logo nos convidaram para beber chaptikus, uma espécie de aguardente de palma, porém mais fraca que o saudoso medronho. Ao 6º shot apercebemos-nos que o karaoke é afinal a porta de entrada para um Universo de alterne puro e duro! Ao fim de mais 8 shots a resistir a promessas gestuais do nirvana à distancia de 50 000rp (cerca de 3,5 Euros), fomos finalmente expulsos da casa por um senhor agressivo que com gestos obscenos nos dizia que se não queríamos daquilo não éramos bem vindos! Mais um momento Kodak!


No dia seguinte precisavamos chegar a um resort, a uma loja ou centro de mergulho onde nos metessem uma garrafa às costas para mergulhar no Estreito de Lembeh. Obviamente não nos preparamos e não faziamos a mais pequena ideia onde ficaria qualquer um destes espaços. À saída do hotel a olhar para o vazio com pontos de interrogação na cabeça, toca de entrar num mikrolet ! Tivemos a sorte de apanhar talvez o melhor mikrolet de Bitung! O mais tuning, o mais rebaixado, com melhores jantes, melhor som e até com uma simulação do ecossitema de coral no interior das portas! 2 Palavras: Alto Estilo! Às oito da manhã estávamos já bombar e a dançar dentro de um pequenos WRC versão carrinha (temos altos filmes deste momento!). A partir daqui foi uma longa deambulação pelos arredores de Bitung, sempre com o melhor som que cerca de 50 speakers debitavam do interior do pequeno mikrolet, à procura dos tais resorts/mergulhos à medida do nosso bolso! À hora do almoço ainda não tínhamos encontrado nenhum budget resort/dives e o nosso driver (que entretanto já só estava ao nosso serviço) sugeriu almoço! “Então, leva-nos ao sítio com a comida mais local da zona !”. Coincidencia, fomos parar justamente ao bairro onde na noite anterior os ratos desciam pelas paredes e senhoras gordas cantavam belas musicas agarradas ao micro. Comemos alto sortido de peixes e ayam (frango) que passam o(s) dia(s) dentro de vitrines não refrigeradas ao Sol. Os molhos picantes encarregam-se de matar salmonelas, estalfilococus, coliformes e outras cenas com nome em Latim. Uma delicia !!

Mas o objectivo era ... Mergulho! E se os resorts estavam fora do nosso budget, o driver levou-nos para um um hostel enfiado numa aldeia já perto do porto que faz a carreira para a ilha de Lembeh. Daqui negociamos com um pescador o transporte para a ilha e umas horas do seu tempo para, ou fazer apenas apneias, ou mergulhos se conseguíssemos um bom deal do lado de lá. Como o pescador não percebeu nada do que combinamos, acabou por nos levar através do contexto do estreito, com vulcões no horizonte e barcos que não param, até um distante resort de mergulho (que por acaso era dos mais caros). Um cardume de seguranças não habituados à chegada de gandulagem despenteada a bordo duma chalupa de madeira, esperava-nos no deck! Felizmente o dive master chefe do resort, um neo-zelandês tambem ele back packer farto de aturar barrigudos ocidentais com material “top gear”, simpatizou e compreendeu a nossa durissima realidade. O resultado foi fazermos 3 mergulhos do melhor, pelo preço de 2 incluíndo um nocturno! O sitio único: água limpissima e areia preta de vulcão como pano de fundo para uma das mais “macro”, raras e coloridas vidas dos 7 mares!

De volta ao porto escuro em plena noite, aterramos no cais de barriga cheia... mas ainda tínhamos à nossa frente um quiosque de músicas a passar grandes êxitos “Heavy Slow” e uns 15 pescadores a beber chaptikus e a comer atum salgado com tapioca! Foi fácil conquistar o respeito de tal fauna com o ritmo a que os shots nos desciam pela garganta... A música do quiosque cresceu em volume e ritmo, sendo depois processada na forma de “break dance” ou dança do “rascasso”! Loucura no porto, no fim tinhamos uma multidão de galhardos aos saltos à nossa volta! 2 palavras : Altos Filmes!


Depois, jantar num tasco de rua e uma corrida na parte de trás de motas pelas ruas até chegar ao hostel.Nessa noite não preguei olho, ainda vivendo as memórias recentes do longo dia! Como pode a vida ser rica, diversa e divertida !


Assim foi passado o meu 32º 19 – 04. Parabéns aos pais!

Tomohon, the bloody market

Já na península Norte o objectivo era ir directo para Manado para explorar toda a região que envolve a segunda cidade mais importante da ilha durante a semana que antecedia o vôo de volta. E se era o contacto com os locais que fazia falta, levamos um verdadeira chapada cultural nas 4 + 10 horas de bus de Marisa - Gorontalo - Manado e com mais uma hora para chegar a Tomohon. Sem dúvida que a certa altura
destas viagens o corpo protesta, especialmente porque as medidas dos bancos estão feitos para eles. Mas no final, quando se olha para o ontem, são as histórias e episódios vividos com os locais que ficam mais marcados (eu sei, já começo a ser chato com este tema das viagens e das pessoas)...

A região que envolve Manado tem pelo menos uns 8 vulcões de altitude considerável, mas o de Tomohon é aquele que está mais activo e por isso o elegido para subir ao topo. Acontece que depois da estafa directa de bus para aqui chegar a horas de acordar cedo e subir ao topo ainda antes das nuvéns, fomos ultrapassados e o dia amanheceu com uma daquelas chuvada tropicais...
Já que estávamos acordados tão cedo, nada melhor do que uma visita matutina ao mercado local. Uma verdadeira experiência para todos os sentidos, difícil de esquecer, especialmente a zona das carnes. Os animais expostos que conseguímos identificar iam para além dos clássicos porco, vaca e búfalo. Ele havia cão, gato, rato, dog bats (morcegos gigantes), asas de morcego, cobras, e ah, já agora têm macacos? Sorry já acabou... Argh... ficamos mal dispostos todo o dia com o cheiro que imanava daquele mercado e que ainda hoje perdura na memória destes “westerner pussies”. Na realidade, até não me importaría de degustar algumas daquelas delicatessens, mas cão ou gato???? NUNCA, tá bem Iarinha???


As nuvens não pareciam querer ir embora desta zona montanhosa e nesse mesmo dia decidimos fazer uma curta (3h) viagem até à costa do Lembeh Strait. Um estreito entre Sulawesi e a ilha de Lembeh, que devido às suas características particulares (corrente, escorrencias de água doce e fundo de areia vulcânica) concentra um número invulgar de espécies marinhas endémicas e outras muito raras. Foi todo ele um dia inesquécivel, pelas espécies raras com quem partilhamos experiências quer dentro quer fora de água e que curiosamente coincidiu com o aniversário do Gonçalo. Assim volto a abrir um parentisis para que seja ele a descrever na primeira pessoa todo este dia.

Togian Islands, the paradise

Desta vez não apeteceu... Tinham passado apenas 5 dias das 10 horas que passamos no bus e agora eram precisos cerca de dois dias para fazer os pouco mais de 700 km até Ampanat, onde se apanha o ferry a partir da margem sul até às ilhas Togian. Solução, fretar um carro com condutor para que a viagem durasse “apenas” 14 horas. Como não abundam turistas nesta época do ano, irmos os dois naquele carro saiu-nos mais caro do que a viagem de avião KL-Sulawesi para os dois... Mas enfim, o preço a pagar para não desperdiçar o pouco e precioso tempo em escalas.

Uma noite na pequena vila fantasma de Ampanat e pela manhã 4 horas num ferry para chegar a um paraíso que nos tinha sido prometido. Um conjunto de ilhas em pleno mar das Molucas que separa a província norte e central de Sualwesi. De facto, a pequena ilha onde ficamos estava muito próximo de um dos estereótipos do paraíso (se é que isso existe). Kadidiri paradise, num pequeno resort encaixado na floresta e com frente para uma praia de areia branca, mar azul com recife de coral e ilhotas de limestone em frente. Quero salientar que este foi o alojamento mais caro que eu fiquei na Indonésia. Este pequeno paraíso custava 10 euros por noite com as três refeições incluídas (estão a começar a passar-se estes Indonésios)... Os mergulhos a preços quase ocidentais, mas aqui as paredes de coral são espectaculares em termos de diversidade de coral duro e mole e de esponjas O peixe esse foi já sobrepescado e apenas à volta duma outra pequena ilha vulcânica se concentram alguns cardumes de lírios, barracudas e outro pelágicos. Só posso imaginar como seriam os mergulhos neste lugar antes de ser dinamitado frequentemente (pelo menos quatro explosões ouvimos durante os mergulhos).

Mas os paraísos são bons até se viverem todos os highlights. Como descansar e esponjar-me ao sol não estava nos meus planos, 4 dias depois de estar a fazer altos mergulhos apenas em calções (água a 31 ºC) num mar azul ou, quando fora de água, a caminhar na selva em busca dos caranguejos gigantes e descobrir outras praias isoladas da ilha ou contemplar o cenário ao pôr do sol do bungalow e interagir com outros turistas (para variar) durante a janta, começou a ficar boring... Começava a faltar-nos o contacto e as histórias com os locais, o melhor de tudo.

O problema era que para sair deste paraíso rumo ao norte só passam ferrys em dois dias da semana e consecutivos (estes Indonésios são loucos, toc, toc, toc). Ou seja, ou se fica lá apenas dois dias (pouco) ou então nove dias (nem pensar). Solução, fretar um barco com skipper até à vila mais próxima a norte, Marisa.

Tana Toraja

Diz a lenda que aqui se fixaram os primeiros colonos vindos por mar da Indochina. Como celebração desse momento de génese de uma cultura em terras distantes e montanhosas, resolveram construir as suas casas de forma a que se lembrassem da sua origem, a sua raiz marítima; Resolveram assim, construi-las em forma de barco! Reza também a história que no caso de uma monção mais agressiva, uma cheia ou um diluvio, as casas sempre flutuariam porque são barcos! Nos campos de Tana Toraja, no meio de montes e vales transbordantes de vegetação, temos encaixadas na paisagem séries de pequenas aldeias com as suas casinhas, umas maiores que outras representando a importância e o destaque do mamífero que a habita! O efeito de conjunto é fabuloso, especialmente visto ao longe, parecem pequenas frotas de barcos de papel a flutuar sobre o verde.

Existem aqui 3 grupos religiosos : Muçulmanos , Cristãos e Animistas . Estes últimos são os representantes da cultura ancestral deste lugar (pagãos, hereges malditos!), ainda hoje realizando rituais curiosos, fúnebres essencialmente, como o faziam à séculos atrás !

Muito resumidamente tudo acontece assim :

Morre alguém ! (esta parte é importante para começar qualquer funeral !)

... hoje em dia existe formol , antigamente mumificavam imediatamente o corpo de forma a conservá-lo por tempo indeterminado. Depois de morto injectam o formolzinho no cadáver e iniciam uma colecta de dinheiro, bens, comida e sobretudo búfalos, para fazer uma grande festa, uma grande celebração em honra ao morto, sendo que maior será a festa quanto maior for o estatuto do finado na aldeia, no clã, na região! Acontece que muitas vezes essas colectas levam vários anos a acontecer ... 6 , 10, 15 anos !

O nice disto é que, enquanto não acontece a tal celebração, os familiares têm de tratar o morto como se estivesse vivo! Têm de falar com ele, dar-lhe comidinha (que obviamente não come!), vesti-lo todos os dias, por aí fora. Quando finalmente têm as condições para fazer o funeral, organizam uma festa que dura 3 dias! Vestem as melhores roupas, sacrificam o maior numero de búfalos possível porque acreditam que para o “after life” dá algum jeito ter praí uns 40 búfalos... enfim , é um festival de luz e cor com direito a alto banho de sangue em praça pública !

No fim da festa o morto finalmente pode ir para junto dos familiares já mortos (normalmente um caixão comum para todos ... vimos vários a abarrotar de ossos!) ... um artista entretanto já acabou a escultura que representa o morto e será colocada ou numa varanda criada para efeito ou num nicho bem próximo de onde o morto irá ficar “arquivado”!

Existem vaŕias tipologias de túmulos :

As “baby graves” como o nome indica, são túmulos para bebés organizados em grandes troncos de árvores mortas ... vimos troncos que teriam uns 30 bebés “engavetados” ! Muita nice !

As “hanging graves” , para malta mais poderosa ! O conceito é , quanto mais poderosa é família, mais alto e inacessível terá de estar o caixão onde depositam todos os ossos da família! Vimos um que deveria ser o Ricky Martin lá do sitio ! Estava pendurado a uns 100 metros do chão numa limestone escarpada e cheia de vegetação que não lembra ao menino jesus ! Alta Classe !

As “ graves em grutas”, que mais não são do que grutas onde metem os caixões, caveiras e oferendas ! Estivemos numa gruta que tinha uma ligação em túnel a outra gruta em que só cabíamos de gatinhas ..tivemos de gatinhar durante uns 40 metros no meio de caveiras e ossadas!

Infelizmente não conseguimos assistir a nenhum cerimónia fúnebre ao vivo. Estas celebrações têm lugar normalmente em Julho e Agosto que é a época onde conseguem reunir mais pessoas. Ainda por cime tivemos “azar” porque era período de eleições nacionais, regionais, locais onde tudo pára! Por outro lado tivemos o privilegio de observar de perto as votações e a contagem de votos numa série de aldeias por onde passamos de moto, quando andavámos atrás dos principais “spots funerários” das vizinhanças de Rantepao! Em algumas, viemos a saber com direito a confusão porque o número de votos contados era superior ao numero de eleitores recenseados. Durante a viagem de mota tive a oportunidade de verificar como a carne é fraca, não com a argentina de 55 anos que nos acompanhava, mas com o Alcatrão Indonésio! Alto espalho de mota numa recta plana e com alguns buracos ... classe de mestria e falta de jeito em fundo de clorofila e campos de arroz !


Os dias que passamos nesta região foram poucos para sentir e absorver tamanha complexidade cultural, mas na globalidade estava visto e fazia falta rumar para Norte ... rumo Togian Islands ! Isto está a ser um espectáculo e pelo que sei (agora no fim da viagem) , ainda iria ser melhor ! O contacto com os locais é tramado de adjectivar e estou em tudo de acordo com o Dr. Ronaldo quando acima escreve sobre as pessoas ! Sim esqueçam a designação Filas, Leonardo, Filipe, Filó, Amorzinho, Passarinho, Bebé, Boca de Folho e outras coisas que lhe chamam ! Não ! - Ronaldo , que é um nome muito mais popular e que nos abre portas atrás de portas e é um quebra gelos aqui nestas terras estranhas, onde até no meio da aldeia mais enterrada no meio de grutas, campos de arroz e limestones, existe uma parabólica construída com caricas de Coca-Cola e Green Sands que lhes possibilita o visionamento dos jogos do nosso craque Cristiano Ronaldo pelo Manchester, pela Selecção... E como Leonardo é parecido com Ronaldo este é o novo nome do Flinsteiger aqui nesta zona. Dizia eu que velhos, velhas, homens, mulheres e crianças todos reagem com pura festa à nossa presença fazendo com que esta viagem deixe uma esteira de alegria e felicidade na memória! ... O Doc e eu a dançar break dance e a dança do Rascasso, temos feito um sucesso além-mar em festas, jantares, portos e lugares pouco recomendáveis !

Deixo-vos com desejo de saúde e sorte e passo o direito de antena ao nosso Mário Crespo que este texto arrisca já o perigo de salmonelas !

Olá, eu sou o José Gonças

Depois de encontrar o José Flinsteiger na pequena cidade de Kuala Lumpur na Malásia, voamos para Makassar, uma das principais cidades de Sulawesi, a maior por ventura, uma coisinha praí para 2 milhões de habitantes. - Porta Sul da Ilha , por aqui começaria a nossa aventura por terras das Celebes, nome dado a estas ilhas e ao mar que as envolve, pelos Portugueses que no século XVI por aqui andaram (andamos) a pontuar pontos do território com fortes, arquitecturas e referencias linguísticas que ainda hoje perfumam as bocas desta malta. Daqui directamente para Rantepao a 330 km Norte e 10 horas! As paisagens “breath taking” sucediam-se a ritmo que só não é alucinante porque a velocidade dos autocarros aqui, poucas vezes atravessa os 50 km/h ... curva mais curva mais curva , sobe sobe desce sobe balão sobe ! E desce novamente e curva e curva e curva para uma estrada que ... já lá não está ! Ou porque ruiu , ou porque foi engolida numa avalanche ou num rio transbordante, ou uma árvore daquelas pequeninas (as árvores aqui são todas bebés! Coitadinhas...) caiu no meio da estrada ... Todos estes episódios elevam as horas de percurso do ponto A para o ponto B exponencialmente, pelo menos para quem estará habituado a um registo ocidental da analise – distancia / tempo que a levo a percorrer !

Isto sucede por toda a ilha o que leva a que muita da história e memórias desta viagem (escrevo já isto no final da viagem) fiquem associadas ao tempo em trânsito... desde autocarro fino, a autocarros com galinhas ou com peixes (dependendo da zona), charter cars, charter boats, ferrys, traseiras de pick-up, mikrolets, ojeks, pet pet, mota, bicicleta ou a pedantes, muito é o tempo que passamos em lugar nenhum. Em transito assistimos à transfiguração da paisagem, envolvemos-nos com os locais que habitam estes meios de transporte. Será esta então uma história de envolvimento: de pessoas, de sorrisos, de paisagens, de lugares, de memórias e abstracções.

Sulawesi

...E acho que não me enganei... Esta ilha de morfologia bizarra é composta por 4 penínsulas montanhosas que sobem quase até aos 3000 metros e que caem directamente num mar azul turquesa (quando longe da civilização) e na sua maioria protegido por paredes de coral. Logo muito por desfrutar nesta ilha, o único senão: o seu tamanho. Subestimei-o, especialmente ao decidir entrar por Makassar, no extremo SW da ilha e sair por Manado, no extremo NE em apenas 22 dias, o tempo que me resta da viagem (snif, snif....). Bem, isto vai significar muitas horas de autocarro e de ferry para atravessar os muito mais de 1000 km que separam estas duas cidades. Com estes dois eu não me importo, o que me chateia é que muito vai ficar por conhecer em Sulawesi, pra não falar das centenas de ilhotas que a rodeiam por todo o lado. Mas queria mesmo passar pelas montanhas da península Sul da ilha e experimentar as fortes tradições culturais ainda presentes e mergulhar em vários spots de mergulho de nível top mundial na península Norte.

Na indonésia dão-te um visa à chegada para 30 dias por 25 dolars e depois obrigam-te a sair para re-entrares e pagar novamente a taxa. Assim fiz escala em Kuala Lumpur onde me encontrei com o Gonças, que decidiu fazer-me companhia nesta aventura Sulawesiana. Acompanhado por um arquitecto vale a pena ficar dois dias numa cidade grande e mais ocidentalizada (para variar as vistas) e visitar as torres gémeas da Ásia. Com um bom amigo vale uma noitada downtown na companhia de CSs locais.

Ainda no avião que fazia a ligação entre Kuala Lumpur e Makassar deu logo para sentir o cheiro de uma das principais razões que me fez querer voltar à Indonésia: as pessoas! já éramos a atracção do avião! Não consigo adjectivar os Indonésios... Não se trata de serem apenas simpáticos ou de nos receberem bem, há como que uma humildade genuína misturada com inocência em cada um deles. O seu sentido de humor está ainda por explorar, riem-se de tudo e para tudo como que crianças envergonhadas. E estas abundam neste país nada envelhecido, e são lindas... É a interagir com pessoas destas que se fica mais frustrado por não conseguir falar a língua deles num nível acima do “apa kabar” ou do “terima kasih”, ou outros essenciais.

Porque vou fazer este último trecho da viagem com companhia, quero também que o Gonçalo contribua para este espaço. Abro aqui um parêntesis para que o Gonças deixe as suas impressões da Indonésia e seja ele a falar sobre o primeiro destino que exploramos em Sulawesi: a região de Tana Toraja. Dá-lhe Gonças...

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O que interessa

Mas já chega de blá blá blá de casas de banho e outras bull shits culturais, o que me pediram foi fotos e não pobre literatura. Então aqui vão algumas imagens dos bons momentos proporcionados pela Wild Sumatera. A realçar: uma caminhada descalço em plena selva tropical, de noite e apenas com luz de um telemóvel e sem trilho marcado, só porque queríamos ver o pôr do sol no mar a partir duma cascata enfiada numa garganta da montanha (brutal); pela selva das Mentawai com uma família de indígenas; residência numa floating house para “tentar” surfar as inúmeras ondas das Mentawai (e tratou-se mesmo de tentar já que aqui os aprendizes são carne para coral ou para a fibra da prancha); descanso no maior lago do SE asiático, uma verdadeira Suíça com clima tropical; e finalmente um dos highlights de Sumatera, spotar Orangutangus num dos seus últimos redutos selvagens.
Sumatera
Depois de tudo isto, a única opção que me restava era continuar a viajar pela Indonésia, aonde? Escolhi uma ilha ao acaso: Sulawesi

Os transportes

Quero deixar aqui também uma nota para outra verdadeira experiência cultural na Indonésia: as infindáveis viagens de bus e de ferry. Queria saber porquê que fazer pouco mais de 600 km de autocarro entre as duas principais cidades de Sumatera (Padang-Medan) demorava cerca de 22 horas. Não arrisquei fazer tudo de uma vez, até porque queria parar em Danau Toba, o maior lago vulcânico do SE Asiático a 18 horas da origem. Aquilo que eles chamam a Trans-Sumatertan Hwy, que que atravessa a 6ª maior ilha do mundo (cerca de 2000 km), não é nem uma autoestrada, nem tão pouco uma estrada que se considere transitável. A maior parte do caminho é um estreito de alcatrão cheio de crateras e quase sempre às curvas. Em alguns sítios a estrada desaparece devido a derrocadas causadas pelas chuvas ficando praticamente intransitável. Numa dessas situações em subida tivemos mesmo que sair do autocarro e ainda assim o “sweaty and crampy bus” não conseguiu subir e teve que ser puxado por uma máquina que puseram lá para o efeito. Devido ao modo de condução deles circular nas estradas de Sumatera é das aventuras mais perigosas que se pode fazer nesta ilha. Deixei de contar as vezes que o condutor do autocarro obrigou o trânsito em sentido contrário a parar devido a ultrapassagens mal calculadas e vice-versa. Mas durante estas 18 horas de trânsito e de inúmeras paragens (algumas delas nem sei porquê) criou-se uma pequena família de Indonésios e um turista. Valeu bem a experiência...

O ferry que faz a ligação nocturna entre Padang e a ilha de Siberute duas vezes por semana, mas que também não é certo (maybe yes, maybe no, maybe today, maybe tomorrow...) - uma classe. Já tinha ouvido falar acerca da qualidade e segurança dos ferrys que cruzam as inúmeras ilhas na Indonésia e este sem dúvida que fazia jus a essa reputação. Por termos reservado com antecedência, conseguimos lugar numa das cabines do barco e assim evitamos ter que partilhar o chão do convés do barco com as várias famílias de indonésios, de galinhas e de ratos para passar a noite (que pena não ter fotos). Acima de tudo partilhar o cheiro e calor intensos desta zona do barco. Nas camaratas - um luxo, cada cabine tem 4 lugares tipo beliche com cerca de 1.7m de um colchão acabadinho de estrear (como devem imaginar) onde apenas que tínhamos que partilhar com algumas baratas que nos iam acordando com cócegas durante a noite com as suas belas patinhas. Quando acordei tinha uma dentro da minha almofada insuflável, não sei como lá foi parar... Mas o facto de termos uma janela cada um, permitia renovar e refrescar ar, evitando o cheiro nauseabundo que vinha do convés. Uma outra experiência, já que quando as Mentawai entrarem definitivamente na rota do turismo isto vai desaparecer...