sábado, 20 de março de 2010

Mais um tornado realidade…

…e um daqueles que me acompanhava há mais tempo, visitar a Nova Zelândia. No meu imaginário os papeis estavam invertidos, viver uma etapa da minha vida nas terras do meio e eventualmente passar umas férias na Austrália. Mas o contrario acaba por servir, até porque como deu para confirmar, as oportunidades devem ser mais escassas num pais dominado por natureza e por ovelhas (10 por cada habitante). Por isso kiwis são chamados pelos Aussies de "sheep shaggers": segundo eles as ovelhas nunca se conseguiriam reproduzir tão rápido sem uma ajudinha...

Kiwi: we fucked you aussie's up in the rugby union!!

Aussie: go fuck a sheep, ya sheep shagger.

Kiwi: leave my mutton out of this...

Mas enfim, apesar da perplexidade de alguns Aussies mais puros, decidi passar as minhas primeiras férias grandes no país vizinho, mas confesso que ainda vacilei entre a NZ e aTasmânia (talvez para depois). O que eu queria mesmo era tirar umas ferias dos trópicos, depois de um ano passado no calor de praias e recifes de coral, saudades imensas de montanha, lagos e até de vestir mais alguma roupa.

Mas antes de rumar para fora do país, tempo para mais uma aventura ao volante à moda Australiana, dois dias seguidos a conduzir até Coffs Harbour, New South Wales, entre Brisbane e Sidney. Ali esperava-me uma semana intensiva de reuniões e brainstorming científico mas também de sessões diárias de surf matinal e por vezes de pôr-do-sol (saudades do pôr-do-sol no mar). Uma belíssima zona costeira selvagem, fora da Austrália tropical, recortada por baías com algumas cidades pequenas mas influenciadas pela presença de uma grande cidade por perto. Deu para reafirmar que Townsville está mesmo perto do cu do mundo... Fez-me lembrar a nossa costa sudoeste, com spots idílicos de surf e mergulho mas onde os golfinhos aparecem para dizer “hey mate” e surfar com o pessoal. Aparentemente os tubarões tambem aparecem mas nao devem dizer “hey mate”. Os relatos de visitas e ataques de tubarões touro e brancos na área deixam uma pessoa pouco relaxada quando se avistam barbatanas dorsais que podem ser de golfinhos ou não).

Mas voltando à NZ, a minha primeira decisão foi viajar apenas na ilha sul. Tinha 21 dias, não é pouco mas também não é muito. Falei com pessoas que fizeram as duas ilhas em menos tempo, mas uma coisa era certa não queria passar o tempo em viagens para fazer “checks” dos sítios e poder dizer que vi a NZ. Com o tempo que tinha, fitei os meus objectivos em caminhar pelas montanhas e visitar a zona dos fiords e a dos glaciares, depois logo se via. E assim foi, chegar e fazer uma viagem de 11 horas de autocarro rumo aos fiordlands no sul da ilha sul. Aqui ia estacionar em Te Anau, na zona dos grandes lagos por vários dias. Primeiros dias eram caminhar durante 4 dias no Kepler Track.

TeAnau_Kepler

Sem querer perder tempo em descansos, fiz para me pegaram às 5 da matina do dia seguinte para 2 dias de kaiak no fiord Doubtful Sound. Como não há estrada até lá, a única maneira de lá chegar é pagar a uma empresa que nos faz atravessar de barco o lago Manapouri duma ponta à outra, para depois pegar num todo o terreno que nos leva até à entrada do fiord. Não é barato, mas era a única maneira de evitar estar num lugar tão místico rodeado de centenas de cruzeiros e barcos rápidos, como acontece no tão famoso primo Milford Sound, de onde surgem quase todos os postais da NZ.... Vale só a pena salientar que essas mesmas fotos são tiradas nas escassas horas de sol por ano que abençoam esta zona dos fiords. Chove cerca de 9000 mm (sim 9 metros) de água distríbuida por 300 dias do ano. Um dos sítios mais chuvosos do mundo...

DoubtfulSound

Estava na hora de rumar a norte com paragem em Queenstown. Uma cidade tipo resort turístico de montanha que vive todo o ano das mil e umas actividades radicais que montanhas, rios e lagos têm para oferecer. Para mim eram demasiadas ofertas em formato de brochuras. Tentadoras, certo, mas depois de uma semana a caminhar e a kaiakar só precisava de baralhar as ideias e de fazer o sangue circular. Fiz uma espécie de base jumping misturado com canyon swing e depois estava pronto para mais montanha. Apanhei boleia até à ponta do lago onde acaba a estrada e começa o Mountain Aspiring National Park. Aqui filmaram muitas das cenas dos anéis e a única maneira de lá entrar é a caminhar, ou então largas a guita em Queenstown para ir numa das excursões de barco rápido, de helicóptero ou de avião e sky diving.........

Queenstown_Glenochy

Não me queria ir desta zona, aqui era O sítio ainda por cima proque o sol voltou no dia seguinte. Mas e o resto da ilha???? Não sei se conseguiria aceitar o facto de estar na NZ e só conhecer uma pequena parte. Diziam-me que a costa norte tinha umas umas praias com floresta a não perder, mas praias... nós temos disso em monte e das boas. No meio da minha indecisão, foi o meu joelho (ou talvez a idade) que me deu a resposta. Depois de tantas subidas e descidas com mochila as costas o meu joelhinho estava a dizer-me para ter alguma calma. Por isso aluguei um carro e subi a costa oeste, passando levemente pelos glaciares até chegar à costa norte.

WestCoast

E por acaso os boatos eram verdadeiros, valeu bem a pena. Um pedaço de costa protegida por parque natural e que só é acessível a caminhar ou pela agua pelos innúmeros water taxis que te deixam em vários spots, ou melhor ainda de kaiak. E impressionante haver um sitio com um pedaço de costa paradisíaca sem estradas. Mas nem por isso deixa de ser muito concorrida, especialmente no verão. Mas era o Setembro deles e optei por instalar-me na extremidade oeste do parque e evitar as zonas mais concorridas.

GoldCoast

Havia uma outra zona que tinha muita curiosidade de visitar desde o momento que apareceu o google earth e comecei a explorar a Nova Zelândia virtualmente, os Marlborough Sounds. Uma zona de costa toda recortada e cheia de ilhas. Nesta fase, caminhar estava mesmo fora de questão (my poor knee) e então optei pela bicicleta. Aluguei uma bicicleta, metemos-nos num barco até à ponta duma das centenas de penínsulas e passamos dois dias em todo o terreno até à outra extremidade da península e aí apanhar um outro barco de volta até a minha base Picton. E já estava quase esquecido do bom que é fazer um todo o terreno, especialmente os downhills a velocidades que se te distrais com as vistas corre-se o risco de se ficar integrado na paisagem...

Marlborough Sounds

Por fim restavam apenas dois dias antes de rumar ao aeroporto de Christchurch. Uma paragem em kaikoura, uma península banhada por uma mar cheio de vida e por isso ponto de encontro de vários espécies de mamíferos marinhos. Nadar com golfinhos não estava nos meus planos, já o tinha feito antes nos Açores de borla e numa água quente e transparente, porquê pagar para o fazer num sítio com água fria e turva? Porque ali nada-se com centenas deles curiosos com o nosso comportamento. Exibem as suas acrobacias à nossa volta, saltam por cima de nós e se os tentares imitar ficam tão excitados que se aproximam ao ponto de se lhes poder tocar. Foi uma experiência... Por outro lado, sabia que em Kaikoura estava a viver um tuga. É sempre bom praticar o português falado do outro lado do mundo e ter um quase local permite sempre disfrutar de mais coisas dos sitios. Obrigado Manel por me abrigares e por emprestares o material de apneia para entrar nesse mar gelado em busca dos Pauas para a nossa janta.

Kaikoura

No final, tempo de fazer o balanço daquela que era uma das mais ansiadas. Em termos paisagísticos é sem dúvida um país excepcional, mas mais porque concentra várias paisagens numa só ilha. Os fiords, por exemplo, não devem ser mais impressionantes que os da Escandinávia, os lagos e montanhas dos Alpes não devem ficar muito atrás destes e até mesmo o parque natural da Arrábida e a sua costa, não ficariam a dever muito ao Abel Tasman national park e a sua costa dourada, se fosse gerido como deve de ser. Acho que isto é o melhor da NZ, pode-se surfar de manhã e à tarde fazer uma descida numa estância de ski ou subir a um pico de montanha.

Mas porque expectativas muito altas podem levar a desilusões, aponto como pontos negativos da ilha sul da NZ o elevado número de turistas e a falta de cultura. É difícil encontrar um “off the beaten trail” para viajar e até os Maori (que se concentram na ilha Norte) se renderam às evidencias e vendem tours para se experimentar durante umas horas a cultura deles guiados por Maoris de camisa (não obrigado). Mas não me apanhou de surpresa, estava já à espera de algo parecido, especialmente depois da viagem na Indonésia sabia que nada iria ser como tal. Mas sei também que “off the beaten trail” existem em qualquer lugar e NZ não será a excepção. Mas aqui requerem tempo e dinheiro ou conhecer locais para aceder aqueles sítios mais remotos e aí caminhar durante vários dias. Mas os únicos Kiwis que conheci eram da ilha norte e estavam na ilha sul a fazer turismo...

Fiquei triste com o performance do meu joelho, que me levou a abandonar as caminhadas no Mount Aspiring National Park mais cedo e por isso nem sequer fui visitar a ponto mais alto da NZ e de toda a Australásia, o Mount Cook com 3755m para evitar a tentação de fazer a ascensão. Mas por outro lado, se assim não fosse não tinha aproveitado a costa norte e também me iria embora com um sentimento de que algo faltou. O que ainda ficou por ver só na ilha sul dava para preencher uma outra viagem. Se um dia volto aqui ou não????? Depende da companhia....